sábado, 20 de fevereiro de 2010

A BONDADE DE DORIAN GRAY

Depois de ter perpetrado inúmeras perversidades em busca de novos prazeres e sensações, e depois de ser aturdido pelos tormentos do remorso e da culpa ao ver que, por um poder mágico, a cada ato que cometia, seu retrato estampava traços reveladores de sua maldade (“um laivo de crueldade na boca”, mancha vermelha na mão, etc.), Dorian Gray decide, já ao fim do romance, adotar uma nova posição face à vida: opta por abandonar os “atos terríveis” que praticara, bem como a amoralidade e o cinismo que os justificavam, para dedicar-se ao bem, às “boas ações”, à atividade filantrópica. É então que seu retrato, o qual funciona na trama como um espelho lúcido de sua consciência, lhe faz uma nova e mais aterradora revelação. Quando pratica o que considera sua primeira boa ação, Dorian Gray vai até o quarto sujo e abandonado onde escondera a pintura para olhá-la, na esperança de que novos sinais mais agradáveis aparecessem no desenho de seu belo rosto, ou, pelo menos, que desaparecessem os malditos “traços do mal”. Porém, para sua surpresa e desespero, “não havia nenhuma modificação, a não ser nos olhos, que tinham uma expressão de astúcia, e na boca, que se apresentava repuxada por uma ruga de hipocrisia”. Sim, o retrato/consciência lançava-lhe na cara, literalmente, que seu ato bom, assim com sua recente resolução de praticar o bem, não passava da mais pura vaidade e hipocrisia. A bondade aparece a Dorian Gray como um ludíbrio de si mesmo e dos outros, onde, sob o pretexto de ajudar o próximo, procura-se somente conquistar e se pavonear com a fama de benfeitor, além de apaziguar uma consciência culpada. Portanto, é ainda o inescapável egoísmo que continua movendo-o, e o outro continua sendo, a seus olhos, um meio e não um fim. Sem poder suportar o peso dessas revelações, sem poder aceitar os remorsos de uma atitude cínica ou a hipocrisia da filantropia, Dorian Gray tenta destruir seu retrato, o que equivale, para ele, a destruir a própria consciência. Mas, em um desfecho enigmático, é ele quem morre, enquanto o retrato permanece intacto, agora, sem os sinais do mal.

2 comentários:

Anônimo disse...

Hummmm!!!

Anônimo disse...

Eduardo, você podia postar mais coisas, não acha? Desenterre seus escritos e lance na grande rede! Estamos aguardando.